Diante da pandemia do COVID-19, muito tem se falado sobre a responsabilidade do Estado em adimplir com as verbas rescisórias dos empregados.
A CLT, no art. 486, dispõe sobre o fato do príncipe e estabelece que no caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.
Contudo, o fato do príncipe não pode ser invocado quando a empresa resolve despedir alguns empregados em virtude da dificuldade financeira provocada pela paralisação, pois o dispositivo legal tem que ser entendido como uma situação de encerramento irreversível da atividade.
Para saber se tem fato do príncipe, o ato governamental tem que ser discricionário, ou seja, configurar uma situação em que o poder público poderia ter evitado aquela medida que implicou prejuízo ao particular. Todavia, o isolamento social, usando a tragédia humanitária que estamos vivendo, é imprescindível. Ou seja, o fechamento do comércio, no atual cenário é uma obrigação do Estado e não uma opção!
Ademais, o mencionado art. 486 da CLT não autoriza rescindir o contrato de trabalho do empregado sem o pagamento de todas as verbas rescisórias, ou seja, não é possível rescindir o contrato aplicando o mencionado artigo e deixar de pagar toda e qualquer verba.
Isto porque, o art. 486 da CLT prevê a responsabilidade do poder público somente no que se refere as parcelas tipicamente indenizatórias, sendo restrita, portanto, à multa de 40% do FGTS, de modo que todo o restante da rescisão do contrato de trabalho e encargos incidentes sobre o TRCT do trabalhador é responsabilidade do empregador, com ou sem fato do príncipe.
Por fim, vale ressaltar que o fato do príncipe é reconhecido somente por meio de ação judicial e quem deve ajuizar a ação é o empregado contra o seu empregador, já que, em regra, a responsabilidade pelo pagamento das verbas rescisórias é da empresa. Assim, em sede de defesa, caso queira, o empregador poderá invocar o fato do príncipe e, com isso, requerer que a indenização (a multa rescisória do FGTS) seja de responsabilidade da Administração Pública.
Caso a Justiça do Trabalho não reconheça que se aplica o fato do príncipe no caso concreto, o empresário seria condenado a pagar a multa prevista no art. 477, §8º, que corresponde ao valor de um salário do empregado prejudicado em decorrência de não ter recebido a integralidade das verbas rescisórias na data correta.
Portanto, sabe-se que o momento é muito delicado por parte de muitos empresários e o senso de urgência os levam a tomar decisões inapropriadas, supostamente embasadas pela lei, mas que só terão o condão de lhes gerar sérios passivos trabalhistas no futuro, sendo essencial o serviço de assessoria jurídica para minimização dos riscos empresariais.